quinta-feira, 15 de setembro de 2011


POLICIAIS DE UPP TINHAM ORDENS DE PERMANECEREM "PARADOS"

A investigação sobre o esquema de corrupção envolvendo policiais da UPP dos morros da Coroa, do Fallet e do Fogueteiro, em Santa Teresa, obteve indícios de que integrantes do comando da unidade estariam recebendo em suas casas o “mensalão” do tráfico. No Inquérito Policial Militar (IPM), concluído na sexta-feira e que foi ontem à tarde para a Auditoria de Justiça Militar do Ministério Público estadual, está o conteúdo de um mês de interceptações telefônicas do grupo suspeito. Nas escutas, o sargento Rinaldo do Desterro Santos, apontado como o articulador do pagamento da propina de traficantes a policiais, mantém conversas frequentes com o capitão Elton Costa Gomes e o tenente Rafael Medeiros, respectivamente, comandante e subcomandante da UPP que foram afastados.
De acordo com a promotora Isabella Pena Lucas, da Auditoria Militar, a investigação teve início há cerca de dois meses, a partir de informações do Serviço de Inteligência da PM sobre pagamentos feitos pelo tráfico para que PMs lotados na unidade não reprimissem a venda de drogas na região. Os valores chegariam a R$ 70 mil mensais. Em 29 de julho, a pedido da Corregedoria da PM, a Justiça autorizou a interceptação de 11 telefones de PMs da UPP, entre eles, o do capitão Elton Gomes e o do tenente Rafael Menezes.
Passados 15 dias, apenas três aparelhos do primeiro pedido de grampo continuaram a ser monitorados. Outros números de telefone foram incluídos nas investigações. A promotora disse que há indícios de que um emissário era encarregado de levar dinheiro da propina para os comandantes da UPP. A conclusão do IPM mostra que o acerto com os traficantes previa mudanças na rotina do patrulhamento nas três comunidades. Para não atrapalhar a venda de drogas, os policiais que integravam o esquema ficavam em bases fixas, em circular pelas comunidades, ou eram deslocados para pontos distantes das áreas de atuação dos traficantes, principalmente nas noites de sexta-feira, sábado e domingo. Essa articulação seria feita pelo sargento Rinaldo. Ele foi preso no último dia 6 deste mês, na companhia dos soldados Alexandre Pinela dos Santos e Gilmar de Freitas Macário, todos lotados à época na UPP.
O trio estava num veículo estacionado em frente ao Batalhão de Choque, no Estácio. No carro foram achados R$ 13,4 mil. Parte do valor, cerca de R$ 8 mil, estava numa bolsa de mercado embaixo do banco do carona. O restante do dinheiro, em envelopes, com nomes, que podem ser de policiais, e quantias que variavam de R$ 400 a R$ 2 mil.
Numa das interceptações telefônicas, o sargento Rinaldo avisa a um dos PMs:
— É para ele ficar quieto, paradinho, na base.
Nas escutas telefônicas do IPM, os policiais envolvidos no esquema usavam códigos para se referir à propina. Num diálogo, o sargento Rinaldo avisa a um interlocutor que está com os “ingressos” nas mãos. Há trechos em que os PMs falam em buscar “camisas” ou “convites”.

Bando invade delegacia, rouba armas e sequestra PMs

Henrique Goes - Repórter

Uma população de aproximadamente seis mil habitantes, sete PM's compondo o efetivo da polícia militar - dois deles cumprem escala diária de 24 horas. Essa é a estrutura da segurança pública no município de Coronel Ezequiel, distante 141 km de Natal. Talvez a desproporcionalidade entre policiamento e população passasse despercebida pelo restante do Rio Grande do Norte não fosse a explosão a Agência do Bradesco no município e o sequestro de dois policiais militares e quatro pessoas da comunidade, ocorrido no final da noite dessa terça-feira (13). As vítimas tiveram uma noite de terror. Foram liberadas em estradas isoladas de diferentes municípios do Rio Grande do Norte e Paraíba.  Eram 10 homens, que ainda não foram identificados nem capturados pela polícia.  

adriano abreuO jovem Kalielson, um dos sequestrados, não quis mostrar o rostoO jovem Kalielson, um dos sequestrados, não quis mostrar o rosto
A ação dos bandidos teve início às 23h30 desta terça-feira (13) quando um grupo de criminosos formado por, pelo menos, 10 homens invadiram a DP de Coronel Ezequiel, fizeram dois policiais militares reféns e levaram da unidade duas pistolas ponto 40, uma calibre 380, uma espingarda calibre 320, uma pistola teaser e dois coletes balísticos. 

Ao saírem da delegacia, fizeram mais quatro pessoas de reféns e seguiram para a agência do Bradesco. Ainda não se sabe se pela insuficiente de explosivo ou falta de experiência no manuseio dele, os bandidos avariaram a estrutura de ferro da unidade de auto-atendimento, mas não conseguiram chegar às cédulas. Sem êxito, os criminosos fugiram para a Paraíba. No município de Sossego (PB) deixaram os policiais algemados a uma cerca, vestidos apenas de cuecas. Daí, o comboio seguiu para área urbana da cidade e tomou de assalto um veículo Fiat Doblô da prefeitura do município e fez reféns duas pessoas que estavam próximas. 

Já em Cuité (PB), os bandidos abandonaram um dos veículos numa estrada e quatro reféns pegos em Coronel Ezequiel (José Wilson - vigia do posto de combustível -, Kalielson Ducerk, e dois adolescentes).  Kalielson contou que a abordagem feita pelos bandidos consistiu em mandá-los para o chão e depois os puseram no veículo de cabine dupla. O jovem de 21 anos contou que não foram ameaçados e que um dos bandidos - todos estavam encapuzados - disse que nada fariam com eles. "Eles disseram que só queriam o dinheiro", lembrou o rapaz, que durante a manhã de ontem circulava pela cidade e era parado por populares curiosos para saberem os detalhes do episódio.

POPULAÇÃO

Os moradores da rua Manoel Casimiro Gomes, endereço do Bradesco, tiveram o sono interrompido pela explosão e o som de veículos usados pelos infratores. "Já era quase de madrugada e escutei aquele estampido. Muito tempo depois botei a cabeça pela porta da área e a rua tava coalhada de gente", disse o aposentado Manoel Pereira .

Ação na madrugada

Bando formado por 10 homens invadiu Coronel Ezequiel, tentou assaltar caixa eletrônico e saiu fazendo reféns e roubando carros: 

23H - Soldado PM Wilson Bezerra é interceptado por pelo menos seis assaltantes quando se dirigia ao posto de combustível vizinho a DP de Coronel Ezequiel, também sede do Destacamento da  Polícia Militar.  Wilson é conduzido pelo grupo de criminosos até a unidade policial, onde o sargento Paulo Estevão se encontrava. É anunciada a invasão e tomada as armas. Ambos são algemados e postos na mala da viatura.     

Outros três assaltantes, renderam o vigia do posto (José Gilvan), um amigo dele (Kalielson Dicerck) e dois adolescentes que estavam nas proximidades. Esses reféns foram levados em um veículo tipo  Ranger. E os policiais seguiram algemados na mala da viatura conduzida por bandidos. Os dois veículos, seguiram para a agência do Bradesco, há cerca de 1 km do local de abordagem.
     
23h30 - Os grupos se dividem e a maioria entra no banco, onde "plantam" dinamite próximo a abertura por onde saem as cédulas. Os bandidos não conseguem chegar até o reservatório do numerário.    

23H50 - Empreendem fuga com reféns policiais na mala da viatura e os civis na Ranger. Atravessam o município de Jaçanã (RN). De lá atravessam o município de Nova Floresta - já na paraíba - e seguem  para Sossego (PB), onde deixam os policiais algemados a uma cerca de arame farpado numa área rural. Os bandidos tiraram as roupas dos PMs, que ficaram apenas de cuecas. 

1h30 - Os bandidos tomam de assalto um Fiat Doblô pertencente a prefeitura municipal de Sossego (PB), fazendo dupla de funcionários refém. Abandonam viatura e seguem no veículo recém-adquirido e no cabine dupla. 

Entre 1h40 e 2h - Os bandidos  descartaram a Ranger e os reféns civis pegos em Cel.  Ezequiel, que dirigiram esse veículo até Cuité-PB onde encontraram socorro da PM/PB.

2h - Bandidos retornam ao RN, abandonam reféns de Sossego nas proximidades de Parnamirim.

03H30 - Após andar mais de uma hora, os dois policiais deixados na zona rural de Sossego (PB) convencem morador de povoado a ligar para o 190 pedindo socorro. Contato resulta no resgate da dupla pela PM paraíbana.

Estrutura de segurança é precária em Coronel Ezequiel

A reportagem da TRIBUNA DO NORTE conversou com o capitão PM Hélder Araújo, comandante da 4ª Companhia Independente de Polícia Militar, cuja sede é Santa Cruz. O gestor informou que a unidade é responsável por 19 municípios (entre esses Coronel Ezequiel ) e conta com efetivo de 207 policiais militares. Ao ser questionado se tal contingente é suficiente, ele respondeu que seria necessário, pelo menos, o dobro para atender às demandas da população. 

O Petrus Antonnius, responsáveis por toda área da 9ª Delegacia Regional de Polícia de Santa Cruz, cuja jurisdição abrange 10 municípios, incluindo a cidade sede. O delegado informou que já foi aberto inquérito para investigar a tentativa de assalto e sequestro em Coronel Ezequiel. Questionado se é possível atender satisfatoriamente às necessidades da sociedade no plano da investigação, foi sincero ao dizer que não, mas tem feito o possível. O coronel Reinaldo, comandante do Policiamento do Interior, argumentou que o que aconteceu na cidade foi uma ação planejada  e garantiu que serão realizadas operações naquela região no intuito de combater a ações de grupos interestaduais.

Bate-papo» Soldado Wilson: PM sequestrado

A reportagem conversou o soldado Wilson, que foi mantido de refém. Ele falou com equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE e expressou sua indignação com o que afirma ser falta de respeito dos gestores pela segurança pública para com o policial. Eis a entrevista:

O que o senhor tem a dizer sobre esse episódio?

Eu quero que seja mais um desabafo do que uma entrevista. Nós policiais militares vivemos sendo humilhados pelo sistema militar. A gente vive no interior do Estado e nas cidades com menos de 10 mil habitantes são encontrados um ou dois policiais. Cumprimos uma escala de 24 horas, o que é degradante e nos expõe. Não quero que aconteça mais isso com meus colegas. Isso está virando rotina e tende a piorar.

Vocês foram agredidos fisicamente ou foi somente violência psicológica?

Não nos bateram, mas psicologicamente estamos muito abalados porque foi muito terror. Ficavam falando que iam tocar fogo na viatura, iam nos jogar vivos. Não suportamos a vida que estamos levando no nosso trabalho.

Havia algum indício, uma marca na fala deles que entregassem ser potiguares ou de outro Estado?

Não...eram de fora. Sou muito observador e maioria deles tinham menos de 27. Eram três que estavam na viatura e outros na Ranger.

Vocês pensaram em algum momento que não sairiam com vida?

No primeiro momento quando estávamos algemados um ao outro dentro da viatura e eles não conseguiram pegar o dinheiro. Depois quando a gente estava na área rural e eles mandaram que saíssemos da viatura e tirássemos a roupa. Achei que a gente ia morrer naquela hora.

Qual o recado que o senhor manda para os gestores da segurança pública?

Olhe pro interior. Não pode mais dois policiais ficarem numa cidade com até 10 mil habitantes esperando a marginalidade vir buscar nossas armas e dignidade.

Mas o amor pela farda permanece, não é?

Será? Eu estudo todo dia pra sair porque tenho amigos com vinte e tantos anos de polícia que ganham 50 contos a mais do que eu. Não temos nenhuma perspectiva de crescimento na profissão. Não temos um plano de cargo, carreiras e salários, não temos perspectiva.




Tribuna do Norte