terça-feira, 12 de julho de 2011

NOVO PARADIGMA A SER ENFRENTADO PELO POLICIAL: NÃO PRENDER, NÃO EXPOR A RISCOS E DAR TRATAMENTO VIP ÀS VÍTIMAS.

Longe está de nós o propósito de mudar a atuação operacional das Instituições policiais e até mesmo de nossos companheiros, mas com o advento da Lei 12.403, de 04 de maio de 2011, que altera dispositivos do Decreto-Lei n.º 3.689 de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal - relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências, muitas medidas adotadas até agora deverão ser repensadas e colocadas na balança jurídico-política, pois o objetivo da lei é fortalecer o princípio de que ninguém será considerado culpado sem o devido processo legal. 
Nossa fórmula é simples para o sucesso profissional dos policiais, de suas Instituições e o reconhecimento público, pois prender, agora, será o ato derradeiro e extremíssimo da atividade policial, doravante, em primeiro lugar, é o atendimento e socorro às vítimas. 
Sabemos que as mais conceituadas policias do mundo dão um tratamento diferenciado às vítimas de crimes e uma delas é a polícia inglesa, onde os cidadãos daquela comuna têm o orgulho e a honra de dizerem bem de sua polícia, baseados quase que unicamente na sua postura de zelar pelas pessoas que foram alvos de infratores. 
No Brasil existe cerca de meio milhão de presos; mais de 1/3 da população carcerária esta reprimida de forma cautelar e com o advento da nova lei, provavelmente, grande parte voltará às ruas e muitos outros que ainda cometerão crimes não serão recolhidos aos presídios de forma cautelar em virtude do novo ordenamento jurídico. 
Nosso policial, diariamente, entra em confronto com criminosos e, muitas das vezes, deixa em segundo planos as vítimas quando deveriam ter tratamento especialíssimo. 
Num total de 99% das ocorrências que resultam prisão, o infrator poderá ser autuado ou não e nos casos de autuação em flagrante serão postos em liberdade ou por fiança arbitrada pelo Delegado de Polícia ou por fiança arbitrada pelo Juiz. 
Portanto, cabe-me alertar todo e qualquer policial que não compensa prender ninguém, pois os infratores não ficarão presos e os policiais que, apesar de terem sua atuação fundada na lei, correm o risco de morte e, ainda nos excessos que por vezes ocorrem, a serem denunciados e processados por tortura, abuso de poder, constrangimento ilegal e por aí vai o rosário de acusações, que todos policiais conhecem e muito bem. 
A nova lei não está equivocada e nem indo de encontro aos anseios sociais. O policial que prende ao invés de cuidar da vítima é que deve redirecionar sua atuação em face do novo mandamento. A prisão é o ato derradeiro da atividade policial e com a nova dinâmica jurídica prender é um risco à profissão e uma desnecessidade. 
Parece uma brincadeira, o policial prende quem está em flagrante, o Delegado é obrigado a arbitrar fiança nos casos que são de sua competência legal e, nos que não os são, o Juiz solta mediante fiança ou adota outra medida de controle sobre o infrator. 
A manutenção da prisão será nos casos extremos em que seja cabível a prisão preventiva que poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. 
A prisão preventiva tem contribuído para eventuais injustiças e ajudado a superlotar os já abarrotados presídios brasileiros. 
Identificado o autor da infração e a materialidade do delito, cabe ao Estado Juiz aplicar-lhe uma pena, isto após ter observado os princípios Constitucionais e direitos fundamentais dos acusados em geral, pois nos termos da Constituição da República Federativa do Brasil, precisamente em seu art. 5, e incisos: 
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; 
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; 
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; 
O princípio da inocência ou presunção da inocência é um princípio jurídico aplicado ao Direito Penal que estabelece a inocência como regra. 
Somente após um processo concluído em que se demonstre a culpabilidade do réu, o Estado poderá aplicar uma pena ou sanção. 
Portanto, a nova regra jurídica veio dar praticidade ao que está escrito na Constituição, evitando assim que antes mesmo de um processo seja a pessoa considerada culpada e presa de forma apressada e depois, muitas das vezes, ao final, ser considerada inocente. 
Não obstante as várias possibilidades de não encarcerar uma pessoa antes do trânsito em julgado de uma sentença, existem também os casos de maior gravidade que permitirão a mantença da prisão cautelar como forma de dar à sociedade uma tranqüilidade antecipada, isto diante de uma ameaça real de nova agressão ou pratica de ilícito pelo preso de forma cautelar. 
No sistema anterior poder-se-ia deixar o acusado de crime solto ou mandava-se prendê-lo preventivamente ou temporariamente. 
Com o advento da Lei 12.403, de 04 de maio de 2011, tem-se a possibilidade de outras opções, além da decretação da prisão preventiva ou temporária, a exemplo da prisão domiciliar, monitoramento por meio eletrônico, recolhimento no período noturno em sua residência após o trabalho, comparecimento periódico ao fórum, proibição de frequentar determinados lugares, pagamento de fiança, internamento em estabelecimentos hospitalares, suspensão do exercício de atividades públicas ou ligadas ao sistema financeiro, bem como limitar sua liberdade de ir e vir dentro do município da culpa, dentre outras. 
Desta forma, permite-se ao Estado manter certo controle sobre os acusados sem ter a necessidade de colocá-los no cárcere. 
As novas possibilidades legais permitem menores gastos financeiros com presos cautelares, que giram em torno de R$ 1.500,00 a R$ 2.000,00 ao mês por prisioneiro; por outro lado, permitem também o fortalecimento do princípio Constitucional da presunção da inocência. 
E as vítimas? 
As vítimas terão tratamento VIP prestado pelos policiais quando do atendimento de ocorrências. 
Caso não dêem tratamento diferenciado às vítimas, em face da nova lei estarão os policiais dizendo que, além de não poderem prender, não cumprirão também seu papel social de socorrer. 
Portanto, está claro que os policiais deverão mudar o foco de sua atuação prendendo menos e investindo mais nas vítimas. 
Se considerarmos que existem no Brasil milhões de criminosos que fazem mais de uma vítima, é lógico e natural que quem vai valorizar o trabalho da polícia são as vítimas e não os criminosos e o reconhecimento não está na simples prisão cautelar do agressor, mas na sua apenação justa e devida pelo Estado Juiz. E na processualística brasileira podemos considerar que quem prende e solta é somente o juiz, daí digo que o policial não poderá ser mais realista do que o rei, pois prender não é mais nosso negócio, se algum dia o foi. 
O modelo atual de política criminal induz que o policial é mero expectador e para perpetuar e garantir o futuro de sua Instituição não pode ser expectador, terá que cumprir um novo papel social e criar um novo paradigma de atuação que coloque em primeiro lugar sua segurança, a legalidade de sua atuação e acima de tudo assistir de forma impecável as vítimas de ilícitos, assim estaremos valorizando nossa profissão e sendo reconhecido pelos nossos clientes e não acusados por criminosos de forma maldosa e visando uma justificativa infundada para seus crimes. 
Zoé Ferreira Santos, advogado e Ten Cel QOR da PMMG.

Fonte: Blog do Cb Júlio