quarta-feira, 24 de agosto de 2011


Juíza assassinada iria julgar tenente-coronel da PM por homicídio

A juíza Patrícia Acioli, executada com 21 tiros há 13 dias, em Niterói , tinha pela frente a missão de julgar um tenente-coronel da PM acusado de ser mandante de um assassinato. A magistrada chegou a decretar a prisão do oficial em dezembro de 2010, mas ela determinou a libertação dele em março passado. O tenente-coronel, que integrou a cúpula da corporação, teria sido baleado numa emboscada em 2009.

Uma lista com os nomes de 91 PMs que respondem a processos por homicídio na 4ª Vara Criminal de São Gonçalo, onde trabalhava Patrícia, foi encaminhada sexta-feira passada pelo Tribunal de Justiça à Polícia Militar . O comandante da PM, coronel Mário Sérgio, disse na terça-feira que essa relação ainda está sendo analisada e que os policiais da lista que estiverem no 7º BPM (São Gonçalo) serão transferidos para outros batalhões. Mário Sérgio voltou a afirmar que, caso seja comprovada a participação de PMs na execução da juíza ou no planejamento do crime, eles serão levados à Justiça, condenados e expulsos da corporação. Uma reportagem do jornal "O Dia" mostrou na segunda-feira que as balas que mataram a juíza são da PM.

Nesta terça-feira, o presidente da seção Rio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), Wadih Damous, disse que as declarações do comandante da Polícia Militar, coronel Mário Sérgio Duarte, de que policiais militares podem ter participado do assassinato da juíza Patrícia Acioli, em Niterói, são "gravíssimas ". Damous afirmou ainda que é preciso ser realizada, com urgência, uma "faxina" na polícia do estado porque, segundo ele, "não é aceitável que tenhamos nas fileiras policiais assassinos ou mandantes de assassinatos". Ainda segundo o presidente da OAB, é preciso combater a corrupção policial e a atuação das milícias. Damous, porém, defendeu melhores salários para os policiais e um melhor aparelhamento das unidades militares, além do fortalecimento das corregedorias.

Com o assassinato de Patrícia, o procurador-geral de Justiça, Cláudio Lopes, transferiu o promotor Paulo Roberto Cunha Júnior, que atuava com a magistrada. Ele agora fará parte do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime (Gaeco). A transferência do promotor foi noticiada na terã-feira por Ancelmo Gois em sua coluna no GLOBO. Além de Paulo Roberto, segundo Cláudio Lopes, pelo menos outros cinco promotores de Justiça estão hoje sob proteção no Rio. De acordo com o procurador, eles foram ameaçados ou cuidam de casos considerados de alto risco.

- O promotor entrou de férias antes mesmo do assassinato da juíza e também já tinha sido convidado para integrar o Gaeco. Com o crime, o convite foi reforçado. Mas a saída da comarca de São Gonçalo não significa que ele não vai mais atuar em casos que envolvam criminosos daquela região. Ele tem grande conhecimento sobre a atuação dos grupos de extermínio de São Gonçalo, e sua experiência vai acrescentar (informações) ao Gaeco, que investiga organizações criminosas - afirmou o procurador.

Segundo Cláudio Lopes, no lugar do promotor trabalharão dois promotores que já atuavam na 4ª Vara, com apoio de outros cinco com experiência em júri. O reforço, além de agilizar os processos que estão tramitando na comarca, vai aumentar a segurança dos integrantes do Ministério Público:

- À medida em que você despersonifica (a atuação num processo), aumenta a segurança do promotor. Ao matarem a juíza com o objetivo de intimidar a Justiça, os criminosos conseguiram o efeito contrário no Ministério Público. Não vamos desacelerar investigações, mas pisar no acelerador. Vamos pôr o número de promotores que for necessário, seja em São Gonçalo ou em qualquer outro ponto do estado. Vamos garantir que investigações sejam feitas e os criminosos, condenados - afirmou Lopes.

Responsável pela criação do Gaeco no Rio, o procurador-geral explicou que uma das razões para a formação do grupo foi exatamente despersonificar a figura do promotor original do processo:

- Nos casos de homicídios que envolvam grupos de extermínio, a participação do Gaeco, além de acelerar os processos, porque são vários promotores, também mostra que a investigação é da instituição Ministério Público.

Para Cláudio Lopes, os grupos de milicianos ou de extermínio, que envolvem a participação de policiais, estão se tornando ainda mais nefastos que o tráfico de drogas:

- Quando (esses grupos) chegam a ameaçar a autoridade, imagine o que não fazem com o cidadão comum. Por isto, precisamos enfrentá-los com mais força, energicamente. O tráfico é nefasto, mas as milícias são igualmente nefastas ou até piores. Porque o traficante nasceu bandido, mas é difícil imaginar que policiais credenciados, que deveriam proteger a sociedade, se voltem contra ela - concluiu.

Desde que foi criado, há três anos, o Gaeco já denunciou 602 pessoas, sendo 24 policiais civis, 50 PMs e um delegado federal, além de auxiliar nas investigações que levaram à apresentação de denúncia contra quatro vereadores: três como chefes de milícias e um por crime doloso contra a vida (todos presos preventivamente). Na área ambiental, denunciou as empresas Thyssenkrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), por crimes ambientais.

Miliciano que tinha lista com nome de juíza vai a júri popular

O juiz Fábio Uchôa, em exercício no 4º Tribunal de Júri de São Gonçalo, decidiu que Wanderson Silva Tavares, o Gordinho, acusado de chefiar uma milícia em São Gonçalo, irá a júri popular . Gordinho foi preso em janeiro deste ano no Espírito Santo com uma lista que constava o nome de 12 pessoas que estavam marcadas para morrer, entre elas a juíza Patrícia Acioli.

Na manhã da segunda-feira, o ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro desembargador Luiz Zveiter voltou a dizer, em entrevista à Rádio CBN, que não negou escolta para Patrícia Acioli. No fim de semana, o advogado da família da juíza, Técio Lins e Silva, avisou que pediria a reabertura de um processo no qual, segundo ele, Patrícia teria pedido proteção durante a gestão de Zveiter, que atualmente preside o TRE-RJ.

- Esse foi um fato lamentável, a morte de uma juíza, e uma juíza diligente. Determinadas pessoas querem fazer deste momento triste um palco para aparecer. Não é verdadeiro - disse o desembargador.


Fonte: Jornal O Globo/ SGT RODRIGUES