sexta-feira, 13 de agosto de 2010

O BOPE É O BOPE!

“25 DE JANEIRO, QUINTA-FEIRA, MADRUGADA... AVENIDA BRASIL, RIO DE JANEIRO. Pneus rodam no asfalto, ruído nervoso, cinco caminhões lonados, velocidade de comboio, destino Zona Norte. É o Batalhão de Operações Especiais da PM, o temido BOPE. Homens com fisionomia fechada mantêm silêncio de túmulo. Um major comanda o grupo; é um grupo treinado para missões de altíssimo risco. Só o comandante sabe o destino e a missão. São comandos, também não são de pergunta. Apenas agem.
O comboio adentra a Brigada Paraquedista. Na pista, ao lado do campo de futebol, o comboio para. Homens descem rápido. Caminham para uma das quatro laterais. Acomodam-se 5 subgrupos, 20 homens em cada barraca. Isolamento absoluto. Total: 100 PMs forjados no aço do treinamento de guerra e no combate ao banditismo. Querem, pedem sem falar, clamam em esquisito silêncio pelo confronto. Sem peleja, morrem de tédio, descontrolam-se, enervam-se, bufam como feras. Muitos deles já passaram por aquele quartel antes de ingressar na PM. Por isso têm no sangue a lava fervente do guerreiro verde-oliva. Mas agora vestem o preto do BOPE, e são tanto de guerra como os paraquedistas que ali ainda estão. Têm, sim, duplo treinamento: no militarismo do combate em qualquer terreno e em qualquer lugar, e na ação policial de risco extremo. Repete-se o procedimento nas principais cidades brasileiras. Todos aguardam, feras enjauladas nos peitos, mantêm a pressão nas veias, querem explodir na ação.”

O texto acima foi extraído do meu romance Operação Arabesco – O tráfico no asfalto, editado no ano de 2000. Ao bolar um título para este artigo, rebusquei adjetivos para encontrar um à altura do valor do BOPE. No final das contas, e das buscas, concluí que o BOPE é substantivo que não se precisa qualificar. É também e sempre o sujeito da ação e predicativo de si mesmo, e desde muito merece verbete nos dicionários e enciclopédias porque é campeão no combate ao banditismo deste mundo real e motivo de orgulho nos corações dos PMs.
O BOPE é tropa que faz tremer o crime, do modo como o inseri no romance para expressar minha admiração (ou paixão) por esses heróis silenciosos, homens capazes de se ocultar sob uma folha de fícus como se fora o tronco centenário do jacarandá. Homens-felinos, panteras negras que desparecem de dia e se confundem com a noite quando escolhem suas presas e infalivelmente as abatem.

O “Caveira” do BOPE é guerreiro sem medo da morte, é garantia da tropa regular e certeza do povo de que o bandido jamais vencerá os homens de bem enquanto existir, e sempre existirá. O BOPE é anjo da guarda da PMERJ e guardião do povo ordeiro. É detentor incontestável da vitória final, não importando quantas batalhas enfrentará hoje e amanhã. O BOPE é passado de treinamento árduo, é somatório de experiências fortes e de sofrimento e mortes, é presente de confronto real e letal aos facínoras, é a nossa certeza de que no futuro o BEM triunfará do MAL.
Faço esta homenagem ao BOPE depois de constatar com orgulho mais uma vitória dessa tropa de elite contra traficantes no Morro do Turano. Faço-o também porque sei que não haveria pacificação alguma sem a ação metódica do BOPE na conquista do território, uma de suas muitas especialidades como força de segurança disposta ao combate. Também esperei este momento para concluir sobre minhas preocupações com as UPPs, e a maior delas se refere avanço delas e o risco de a entropia atingir esse sistema operacional na sua retaguarda. Observei até agora o círculo sem o saber vicioso ou virtuoso. A reação dos bandidos no Morro do Turano me serviu como certeza absoluta de que não há adversário no banditismo capaz de fazer recuar o BOPE nem as UPPs, e a tática variada de incursão no acidentado terreno do Turano é prova inconteste disso. Não estou mais preocupado. O meu otimismo de antes aumentou e venceu as minhas preocupações maiores. Como explicarei adiante, rendo-me à realidade de que o círculo das UPPs há de ser a mais e mais virtuoso graças ao BOPE!...
Quanto aos marginais que buscaram a rota de fuga depois de ligeira reação na qual se deram mal, isto faz parte da arte da guerra, que o BOPE tão bem conhece. Não é hora de escorá-lo uma operação do tipo “martelo e bigorna” para massacrá-los. Porque, mesmo sendo uma guerra de guerrilha, sem ideologia, a não ser a dos benefícios do tráfico, não é uma guerra, mas ação policial contra marginais num sistema de legalidade. E aí reside a parte mais complexa da ação policial: narcoguerrilheiros são enfrentados como bandidos comuns e não o são. Esses malfeitores formam grupos paramilitares fortemente armados e organizados em estratégias e táticas de combate em zona urbanizada, o que mui bem conhecem, com a vantagem da despreocupação com quaisquer limites legais.
Analisando-se friamente a questão, é combate desigual e desfavorável às forças do BEM. Mesmo assim, a PMERJ avança e vence, e avança, e vence, e avança, e vence, e hoje grava como emblema de superioridade a conquista do famigerado morro do Turano. Serão então doze UPPs instaladas em ambientes variados, em morros e baixadas, isto não importa, o BOPE sabe avançar como a pantera negra em qualquer terreno, na selva e na cidade. Também não importa que rumo esses covardes de rabo entre as pernas estão tomando, eles são como os ratos a buscar o esgoto para se ocultar, e a movimentação acovardada deles os expõe à identificação. O anonimato, uma das armas de que fazem uso confundindo-se com os moradores decentes de suas comunidades originárias, desmorona-se na fuga. Bandido fora do seu homizio é “peixe fora d’água”.
Não vou deixar aqui de questionar alguns detalhes das UPPs, como o venho fazendo, sem, entretanto, colocar-me contra elas. Mas, confesso, meu temores diminuíram deveras, e eles se reportam ao meu passado de comandante operacional. Em 1989, tive minha própria experiência de conquista e ocupação: expulsei os traficantes da Favela Para Pedro (Comunidade da Vila São Jorge), situada em Colégio, Zona Norte do Rio, por trás da CEASA. Tratava-se de localidade que funcionava como “estica” de Acari por sua posição privilegiada: plana, com diversas entradas na beira do asfalto movimentado, portanto de fácil penetração por viciados ávidos em cocaína e maconha. Em se tratando de comércio de drogas, um local privilegiado...
Depois de conquistado o terreno, o que fiz com tropa regular do nono batalhão (justiça seja feita, a tropa regular é de altíssima qualidade, capaz de demonstrações incomuns de coragem; mas não deve agir sempre no modelo militar de ação e sim como grupamento de policiais dispostos no terreno em policiamento preventivo, prioritário na preservação da ordem pública). No caso, agi excepcionalmente como tropa e depois implantei um policiamento ostensivo durante 24 horas garantindo a paz na localidade. Toda essa história está contada em livro disponível no meu site www.emirlarangeira.com.br (Cavalos Corredores – A verdadeira história).
Mas, infelizmente, pude acompanhar o desastre posterior: retirada do policiamento, retorno dos bandidos e retaliações letais a moradores que acreditaram que a PMERJ lá ficaria permanentemente. Daí a minha preocupação com as UPPs, bem menor após da junção delas numa Unidade Especial comandada por coronel PM. Isto me deu a certeza de que as UPPs vieram para ficar. E se vieram para ficar, não importam quantas serão instaladas nem onde será a seguinte. Só fato de torná-las policiamento permanente garante a observação das falhas e as correções de rumo para evitar que qualquer processo entrópico prejudique ou até destrua esse sistema operacional denominado UPP. A diferença é que de Policiamento Complementar, sua característica intrínseca, tal como se observa em policiamento de eventos como o Carnaval e outros semelhantes, a UPP se tornou um poderoso e perene Destacamento de Policiamento Ostensivo Normal em plena cidade, e é o que basta.
Como tenho o hábito de registrar minhas ideias no papel, posso afirmar com segurança que sempre critiquei o fato de comunidades carentes só receberem do Estado repressão policial, tanto da PMERJ como da PCERJ. Da coirmã, tudo bem, ela vai com endereço certo para reprimir como polícia judiciária o criminoso por ela singularizado em investigações preliminares. Mas a PMERJ tem de ter em mente a prevenção no primeiro plano, ação operacional que não pode ser privilégio somente do asfalto. Prevenção é direito de todos.
Muitas vezes defendi que deveria haver batalhões instalados em comunidades carentes, atuando na prevenção como missão precípua e na repressão como missão excepcional. Hoje, embora me mantendo alerta em relação às UPPs (creio que falta muita coisa e há o perigo de o Estado não complementar o trabalho policial das UPPs com a inclusão social por inteiro dessas comunidades livres do terror das armas do tráfico.), não posso mais conter meu ufanismo ao me tomar a certeza de que o segredo do sucesso das UPPs está na real possibilidade de o BOPE retornar às áreas ocupadas por UPPs e reprimir quaisquer tentativas de reconquista desses territórios por bandidos perdedores. Cá pra nós, eles não são loucos, como intentou sê-lo um malandro do Turano, claro que só na teoria, ao distribuir suas ameaças num papel retratado por O Globo de 11/08/2010, p. 16: “É o Turano e o bonde do Gordão. Nós vai voltá.” Nós vai voltá nada! O BOPE, tropa maravilhosa, aplaudida por todos os PMs na ativa e na inatividade, orgulho da PMERJ como um todo, a pantera negra que não está de brincadeira, jamais permitirá!... Sabem por quê?... Ora, porque o BOPE é o BOPE!



Blog do Emir Larangeira