Bombeiros do RJ...
Difícil não expressar opinião diante do caso dos bombeiros do RJ. Por mais que a distância dos assuntos de segurança pública seja considerada saudável para mim, um fato como esse é de estarrecer qualquer um. Sem querer atribuir culpas, convido-os a uma breve reflexão sobre o que ocorre no país inteiro há décadas.
Alguém acredita que centenas de chefes de família sejam levados a um ímpeto como o que foi visto na TV, por uma simples questão de vandalismo? Será que esses mesmos homens levariam mulheres e filhos, munidos apenas com a intenção de se amotinar?
Meus caros, é visível a tragédia que o Rio de Janeiro já exporta para o resto do país há tempos. Ouvi outro dia um colega dizer que em Maceió, minha terra natal, onde a tranqüilidade era quase palpável, existem lugares onde a PM não vai, pois os bandidos estão de posse de fuzis e outras armas de grosso calibre.
No RJ, em especial na cidade que deveria ser maravilhosa, encontra-se em andamento um plano escancarado de maquiagem da questão de segurança, por conta dos dois grandes eventos esportivos que ocorrerão em breve. Meus aplausos para as unidades de polícia pacificadora, as famosas UPPs. Mas até mesmo seu mentor, o Secretário de Segurança Beltrame, pessoa bem intencionada, do bem mesmo, percebe que apenas a ocupação policial não dará os resultados que sociedade PRECISA. O que temos hoje é uma SENSAÇÃO DE SEGURANÇA. Para que ela seja realmente estabelecida em padrões aceitáveis, o Estado deve fazer muito mais do que faz. Não deixar tudo nas costas, nem sempre idôneas, do terceiro setor, é um erro crasso. A necessidade mais gritante daquelas comunidades é de que os serviços essenciais estejam presentes ali.
Nesse processo de marketing institucional, no qual se vende uma imagem de que existe uma preocupação grande com a segurança pública, o Estado consegue convencer uma parte considerável da sociedade. Até que algumas engrenagens da máquina governamental, engrenagens que já apresentavam grande desgaste há tempos, começam a não funcionar mais. Por uma questão de dignidade, por uma preocupação grande com a manutenção de condições mínimas para suas famílias, profissionais de segurança partem para o extremo.
Será que alguém em sã consciência acredita que o salário de bombeiros e policiais militares do RJ beira a dignidade? Muitos dizem que quando esses homens fizeram concurso, sabiam que encontrariam essas condições pela frente. Mas, eu falo por mim mesmo. Quando fiz prova para a polícia federal em 1993, o salário seria, em valores de hoje, pouco maior do que mil reais. Será que os 250 mil candidatos daquele concurso o fizeram pensando em corrupção? Óbvio que não...Idealismo e vocação, além de uma grande esperança de que no futuro, as coisas melhorem.
Entretanto...nada melhora. O governador vai à TV e diz que houve um grande investimento em viaturas. Parece uma doença entre os gestores de segurança, comprar carros novos, desfilar com eles pela cidade e mostrá-los em todos os noticiários. Um equívoco lamentável. O material humano, a logística e uma eficiente administração são muito mais eficientes do que dezenas de carros brilhando.
O estudo sério da área de segurança mostra o quanto as diretrizes adotadas estão erradas. Nos EUA, por exemplo, o investimento maior é na formação do pessoal, nos equipamentos de uso local e, principalmente, equipamentos de comunicação. Uma equipe que se desloca com eficiência, em ações coordenadas e multidisciplinares, tem muito mais chance de lograr êxito em seus objetivos. E, para isso, não são necessárias dezenas de viaturas novas, que em pouco tempo serão sucateadas por uma péssima logística e manutenção de meios materiais.
Quantos policiais militares não sentiram vontade de cerrar fileiras com os colegas bombeiros? Eu, pessoalmente, acredito que inúmeros. Têm a mesma origem...basicamente as mesmas condições de trabalho e sofrem com o mesmo descaso. Nunca mais esqueci uma frase que o Delegado Hélio Luz disse uma vez para mim e para o hoje Deputado Estadual Marcelo Freixo, na época em que dávamos aulas na mesma escola. Segundo o Delegado Hélio, a classe média quer uma polícia que trabalhe para ela, como verdadeiros “cães da burguesia”. Isso se mostra claro, quando são presos dois traficantes. Um do morro e um da zona sul. O primeiro é um bandido do Comando A ou B. O segundo é um doente, “coitado”, que precisa de tratamento. “A polícia exagerou com o garoto...” dizem. É isso mesmo, Dr.Hélio. O senhor estava coberto de razão.
E mais uma vez, a sociedade berrou, com a inaceitável manifestação dos bombeiros. Afinal, quem ficaria nas torres das praias, para evitar os afogamentos dos playboys drogadões ou embriagados? Então, ouviu-se o grito: “Acionem os cães da burguesia!!!” E assim foram os Mikes, para sufocar seus colegas de origem. Explosões e até mesmo tiros com munição real foram ouvidos dentro do quartel.
Um pouco mais tarde, uma cena dantesca, com os bombeiros ajoelhados, com as mãos na cabeça, concentrados em um campo aberto, como prisioneiros de guerra. Os Mikes, de armas em punho, certamente com a vergonha dominando suas almas, protagonizando a cena. Não lembram que o mesmo autor da ordem de sufocar os “amotinados”, não hesitará em destruir qualquer pretensão que vá de encontro aos seus planos.
Assim , meus caros, vejo com olhos tristes mais um capítulo do descaso. Descaso com tudo o que é digno. É duro perceber que certos segmentos do funcionalismo são meros instrumentos de marketing institucional. Historicamente, neste país, sempre foram...e não há previsão de que deixem de ser.
Boa semana a todos
Blog Anjo da Noite
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